o vício

Publié le par Bel Butcher


Ia postar isso como comentário lá no comentarista, mas achei interessante colocar aqui.

Queria compartilhar aqui um vício. Um vício contra o qual lutei às duras penas no Brasil e que, aqui, finalmente ganho uma certa paz, ameaçada apenas quando estou na esquina da Temple com a Rivoli…

Confesso que tenho uma certa obsessão por produtos de papelaria como um todo. No Brasil, morar no Humaitá não é exatamente morar no Leblon, perto da jou-jou, mas as tentações são inúmeras. A cada esquina, uma «papelaria de bairro». Era difícil. Se quisesse ir à Rua Humaitá, passava por duas. Cruzar a Voluntários para ir até a Cobal, outras duas. Estava cercada por papelarias e sentia que a ilha ia afundar a qualquer momento e que eu teria que escolher entre mais uma caneta ou a ração da Paqueca....

Mas Paris é diferente. Respira comércio variado. Se não estou em St. Michel tá tudo bem, estou longe de tentações mais pesadas. Aqui perto tem uma Office Depôt. Ok, ela é legal mas é a única papelaria com P maiúsculo, que merece esse título pela bandas. Mas já conheço seu estoque de cor e salteado. Sabe, eu gosto de novidades!



Logo no início, resolvi comprar algumas coisas para o mestrado. Para aulas, cadernos, canetas, lapiseiras, lápis (sim, as duas coisas), borracha, apontador, grampeador de papel, tesoura, cola, régua (não faço colagem, mas é que tava precisando aqui em casa, entende?). Tipo, um kit básico de sobrevivência na selva.

Mas minha primeira vez foi um choque cultural. Todos os itens estavam ali, bonitinhos, separados. Ótimo. Mas, quando fui à prateleira de cadernos, ávida por dois ou três diferentes, de tamanhos variados, com ou sem plástico para colocar as folhas que os professores iam me dar, eis que levo uma trauletada na cabeça e quase desmaio. Aqui, minha gente os cadernos, tadinhos, tão indefesos, não sei como deixam num país fazer isso com eles. Mas, enfim, cadernos aqui, são quadriculados (óóóóóóóóh !!!!) ou têm tantas linhas que você não saber mais o que escreveu (óóóóóóóóóóóóóóh !!!!)…

É muito triste isso. Muito triste. Eu queria chamar os defensores dos cadernos fracos e oprimidos.

Ok, vocês devem estar agora pensando «mas, caramba, ela está em Paris, precisa incorporar elementos culturais de lá, ora bolas». E eu faço isso. Já sou mal-humorada no metrô, atropelo as pessoas também no metrô, como salada com batata risolé, devoro um milhão de queijos fedidos… Faço quase tudo como uma boa francesinha. Juro. Só tem algumas coisas que não dá. Uma é ver filmes em V.F. e a outra é abdicar dos meus caderninhos e blocos. I-m-p-o-s-s-í-v-e-l.

Quando olhei para aquelas páginas cheias de informações – quadrados ou linhas para todos os lados – senti-me só, desesperada. «Como é que eu faço agora?» E, mesmo não acreditando muito nele, recorri a deus, pedindo um plano b, uma alternativa qualquer. E ele, mesmo eu não levando a menor fé, me salvou de mais uma. Escondidinhos, sem muito alarde, oprimidos entre vários outros cadernos, lá estavam eles, se sentindo ainda patinhos feios. Mas mal sabiam eles que, para mim, eles eram verdadeiros cisnes. Cadernos robustos, capas sólidas (laranjas, bonitas!) e por dentro, o belo recheio de linhas horizontais separadas por espaços decentes! Foi lindo o meu encontro com os cadernos Oxford., que dizem apenas «made in E.U.». Um pouco vago, mas já dá para saber que não foram feitos aqui na França, como é o caso dos Country (urgh!). Nesse dia, não resisti. Comprei três cadernos e mais dois blocos enormes da mesma marca. Com um porém. As folhas dos blocos eram… amarelas… hum, ok estranho, mas eram mais baratas.


Depois freqüentei várias vezes a papelaria. E, infelizmente, eles só têm cartas de fidelidade para empresas. Eu, confesso, sou praticamente uma, tamanha é a quantidade de produtos que compro quando entro lá. Já voltei, claro, e já atualizei meu estoque de cadernos e blocos. Mas, a última vez não foi lá.

O vício renasceu mesmo quando resolvi que a casa deveria ser mais organizada. Sabe, morar na França significa guardar qualquer papelzinho – de contra-cheque a extrato bancário, passando por cartas do serviço de saúde público a declarações de próprio punho do seu proprietário, mesmo que você veja aquele papel surrado (e cheio de quadradinhos!!!) e não dê nada pra ele, mas, acredite, ele é uma declaração válida de que você mora em algum lugar e que você pagou o aluguel… Enfim, e morar num mundo de papel – seja do mestrado ou da vida burocrática francesa, num 32 metros quadrados não é nada fácil.

Onde eu estava mesmo? Ah, sim, na resolução de início de ano.

Pós-doc T aconselhou-me a ir então na BHV (leia-se B ache V), uma dessas Mesblas da vida, mais chique. Tem de um tudo ali dentro. Pois, lá fui à esquina da Temple com Rivoli.

Nunca precisei entrar lá. Sei lá, sempre tive medo dessas lojas que te abduzem e você corre o risco de voltar pra casa no sábado seguinte só porque te expulsaram. Mas entrei. Num primeiro instante me senti uma daquelas crianças ao entrar na Willy Wonka’s Factory. É bonito de ver, no início. Uma coisa de louco. Inúmeras opções de… cadernos quadriculados e repletos de linhas! Como pode isso?


Comecei a me desesperar. Onde eles estão? Sim, não é possível não ter! Nem que sejam os bons e velhos Oxfords!

Horas depois encontrei o que tanto procurava. Aí, lembrei de que estava lá para comprar pastas, pastas-plásticos entre outras coisas do gênero.

Mas outro dia fui lá. De novo. A idéia continuava sendo comprar coisas para a organização. Aí, vi cadernos de capa de couro mole – sem linhas, outra especialidade daqui e melhores do que o excesso -, que deverá ser meu caderno da próxima viagem, um milhão de tipos de agenda e… blocos Oxford, com a vantagem de, dessa vez, haver opções em folhas amarelas e brancas !!! (10 centavos mais caras). Não resisti. Tava precisando mesmo e pronto, comprei dois. E ainda levei um caderninho lindo, simples, com capa bonitinha, vermelha, e com recheio branquinho, com belas linhas espaçadas. Uma beleza mesmo. Ah, e uma caneta porque ninguém é de ferro. E post-its para a organização dos livros da biblioteca nos quais não posso escrever (pois é, sou viciada em papelaria, mas, na hora H, escrevo nos livros. Heresia pura, eu sei, mas é tããão prático.



Enquanto isso, pos-doctor T estava na Gilbert Joseph, tentando comprar mais um guia de viagem para a próxima. Mas essa é uma outra história, sobre um outro vício.

Veja só a confusão que é um texto escrito com a minha linda letra no meio de todas essas linhas.. Pas possible!


Je suis moche...

à esquerda um caderno lindo e feliz. já à direita.... no comments.



Publié dans à Paris

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S
<br /> Oi Bel,<br /> <br /> Encontrei seu blog recentemente  e gosto muito de tudo que vc escreve. Nossa sua dica vai me ajudar, pois moro em Paris e uso estes cadernos daqui, nunca tinha encontrado com linhas largas e<br /> lindas. :))) Vou passar na BHV correndo. Que alegria sua dica!!! Abraço.<br /> <br /> <br />
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B
<br /> Olá, Silvana!<br /> Seja bem-vinda, volte sempre e comente sempre!<br /> Bom, se estiver perto de uma Agora - uma grande banca de jornal - aproveite para entrar porque eles têm uns cadernos da Clairefontaine, a dica que a Grazi deu, e que são cadernos bem bonitos.<br /> <br /> <br />
B
Que bizarro. Pra mim o Brasil era o último dos lares dos cadernos felizes, de tanto que procurei e nunca achei nada à altura dos "molequinhos", como chamo os afamados e caríssimos Moleskines. Esses, sim, são lindos. Tinha pra mim que a marca mais brasileira de um caderno brasileiro era não a pauta (isso deve constar nos direitos humanos dos cadernos, meu deus do céu, mas o que esses franceses estão fazendo?) mas as capas da Tilibra, com os jovens de jaqueta de couro e cabelo anos 90. Mas veja que me enganei. É essa síndrome do vira-lata que a gente tem... (Mas será que no quesito papel de carta os franceses não têm nada bom a oferecer? Pô, deve ser legal.)
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B
<br /> Bea,<br /> <br /> vai depender do seu gosto. é claro que as capas da tilibra não ajudam em nada o país receber o status de ter belos cardernos. e é bem verdade que não falei da aparência externa, mas da beleza<br /> interna dos cadernos. aí, o brasil entra bem. pelo menos para mim. não gosto de quadradinhos nem de linhas em exagero.<br /> <br /> gosto de cadernos lisos, sem nada. mas me deixam um pouco deprê porque eu não tenho exatamente uma lineariedade na minha escrita, digamos assim, nem sei desenhar. ele é um pouco inútil para<br /> mim.<br /> <br /> os moleskines são realmente lindos. e eles não têm linhas. mas eles são pequenos, então tudo bem. outro dia compramos um sobre Paris. ele tem umas bossas novas. mas ainda não ousamos escrever<br /> nele... sei lá. eu tenho medo de estragar, ter que apagar, rabiscar...<br /> <br /> Quanto aos papéis de carta, não tenho como te dizer. não conheço muitos. fiz uma microcoleção na minha infância, mas aqui nunca parei para olhar. quando passar pela bhv vou dar uma olhada. eles têm<br /> alguns por lá.<br /> <br /> <br /> Grazi,<br /> <br /> eis que, numa insônia daquelas, finalmente rabisquei no caderno mais bacaninha, comprado e, até então, não usado. Eis que, quando pego, lá está a marca. clairefontaine... ironia, né? tinha tanto<br /> medo do caderno que nem fui fuçar o nome da marca... aiai. ah, sim, ele é bem bonito! simples, mas bonito. e branco. e com linhas espaçosas entre elas!<br /> <br /> <br />
G
Oi, Bel! <br /> <br /> Se parece que eu não lia o seu blog há milênios e resolvi recuperar o tempo perdido... é porque deve ser verdade :-)<br /> <br /> Eu sou tão viciada em cadernos que o Kai começou a dizer que eu só deveria comprar um novo quando eu tivesse usado um dos antigos que eu tenho em casa. Eu fingi que não ouvi... <br /> <br /> Mas enfim, estou postando esse comentário mesmo é pra dizer que tem uma marca de cadernos francesa chamada Clairefontaine que é muito boa! Pelo menos aqui na Alemanha eles têm cadernos pra todos os gostos, inclusive com linhas bonitinhas e espaçadas como você gosta (e quadriculados ou sem linhas como eu gosto, afinal eu não escrevo nada, só rabisco, desenho e faço conta :-)<br /> <br /> Não é possível que não tenha por aí também! Dá uma fuçada na próxima vez que você tiver uma recaída...<br /> <br /> Beijos e espero ter sido de alguma utilidade!
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B
<br /> Puxa, Grazi, que bom saber que você passa por aqui! para mim era novidade.<br /> <br /> eu também tenho essa mania de não usar os cadernos. olho para aquela folha em branco, liiinda, e não tenho coragem de escrever "n'importe quoi". é meio sagrado. o conteúdo deveria ser importante,<br /> aa altura da folha em branco. aí, alguns cadernos que pos-doctor T me deu (uns de praga, bonitiinhos) eu finjo que eles não existem. olho, toco, mas não ouso colocar nada ali dentro. pelo menos por<br /> enquanto.<br /> <br /> <br /> e obrigada pela dica. claro, já "googuei". reconheci imediatamente os cadernos. mas tô achando que é a síndrome da manga tipo exportação. saca, manga brasileira sem fiapo? pois é... eles devem<br /> exportar os "normais" também e deixar os quadrados e over-linhados para o mercado interno. mas vou continuar minha eterna busca pelos cadernos bonitos e legais.<br /> <br /> <br />
M
Bel, é tão bom quando a gente encontra gente como a gente!! Sou enlouquecida por papelarias e, confesso, tenho um hábito ridículo de estudar com lumicolor (aquelas canetas fluorescentes) e cada cor tem um grau de relevância. Eu sei, a leitura fica dez vezes mais lenta, dá trabalho, mas tenho fé na memória visual... e o uso também é garantia de idas frequentes às lojinhas!<br /> Um beijo,<br /> Mariana<br /> <br /> PS: sempre achei que essas folhas de quadradinhos fossem pra engenheiro, matemático...
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B
<br /> Pois, Mari, encontraste. Porque eu sou capaz de ficar horas e horas dentro daquelas micro-papelarias que não têm nada de mais. Agora, talvez pior que papelaria, seja banca de jornal. As com ar<br /> condicionado daí, então, nem se fala! um convite para uma tarde inteira! Mas isso é para um outro post.<br /> <br /> Ah, sim, já ia me esquecendo. Pos-doctor T irá concordar com você quanto ao uso científico do caderno quadriculado. É que é uma tradição dos pasteurianos usarem caderno de labô quadriculado. Mas<br /> isso eu deixo a própria explicar, no dia de são nunca, quando ela passar por aqui.<br /> Bjs e volte sempre.<br /> <br /> <br /> <br /> PS: Os meus comentários não acrescentam números (no cheating!). Portanto, vocês têm que entrar anyway na tela de comments, please...<br /> <br /> <br /> <br />
A
ai, bel, sofro do mesmo vício. e tenho impulsos loucos dentro de armarinhos também (embora não faça idéia do que se pode fazer com uma fita colorida), mas confesso que gosto dos blocos quadriculadinhos (os execssos de linha, francamente...).<br /> já já você vai me levar para passear por aí.<br /> saudades muitas
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B
<br /> Bom, Ana, então você vai sair daqui com uns caderninhos quadriculados. É o que não falta por aqui.<br /> <br /> Venha logo então. Agora tenho uma francesa nazi para ler minha dissertação. Agora tenho mais (ok, não precisava de mais um) um motivo para correr... para não levar "pedala" dela.<br /> <br /> <br />